No dia do gari, Renato Sorriso conta sua história na Comlurb
Em entrevista à FOLHA DIRIGIDA, Renato Sorriso revelou como foi aprovado no concurso Comlurb e seus desafios como gari.
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Publicado em:16/05/2019 às 09:20
Atualizado em:16/05/2019 às 09:20
Desde 1995, quando foi aprovado no concurso para gari da Comlurb, Renato Luiz Feliciano varre uma praça na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro. Mas, sua vida se transformou depois de sambar durante a limpeza do carnaval. Ele foi do anonimato as capas de jornais e revistas. Nascia o Renato Sorriso.
Nesta quinta-feira, 16 de maio, é comemorado o dia do gari. Para descobrir como é a rotina da profissão e seus maiores desafios, FOLHA DIRIGIDA conversou com Renato Sorriso, um dos maiores representantes da categoria.
Com uma vassoura na mão e muita disposição para trabalhar, o gari conquistou o Brasil e o mundo. Sorriso já viajou para mais de dez países e participou do encerramento dos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012.
Mesmo com a fama, até hoje, ele varre a mesma praça. E sabe reconhecer de onde veio: “É da vassoura que eu varro meu chão, é da vassoura que eu sustento meu pão”, revelou.
Renato Sorriso foi aprovado no concurso Comlurb (Foto: Prefeitura do Rio)
Sua rotina começa na Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro às 04h30. Para chegar ao trabalho, ele precisa pegar dois ônibus.
“Depois, troco de roupa, bato o ponto, tomo café da manhã e vejo minha ordem de serviço. Chego na praça por volta de 06h05 e começo minha rotina de trabalho. Paramos para almoçar e retornamos em seguida. Ao todo, são oito horas de trabalho. Nós temos o compromisso de manter a cidade limpa. O gari está para conservar a cidade”, detalhou.
Ao ser questionado sobre o grande desafio de ser gari, ele respondeu que é brigar por uma parcela da população que não respeita o trabalho.
“O preconceito diminuiu, mas as pessoas ainda pensam que só terno e gravata que é importante. Antigamente, quando alguns garis pediam água, as pessoas colocavam em copo de plástico. Também não sentavam perto do gari no ônibus. Mas, quando tem uma enchente, ligam correndo para o gari”.
Sua trajetória nem sempre foi marcada por autógrafos, entrevistas e participações na televisão. Renato Luiz já vendeu picolé, foi camelô, trabalhou em cervejaria e loja de móveis. Em 1994, quando estava desempregado, um edital do concurso Comlurb para gari foi divulgado.
Foi então que ele resolveu tentar uma vaga. Fez a prova e foi classificado. A convocação ocorreu apenas em dezembro de 1995. Nos três meses seguintes, Renato passou pelo período de adaptação, em que conheceu as principais áreas de atuação na Companhia.
“Fiquei três meses na prova de fogo, fui trabalhar no caminhão, na varredura, na capina, limpando as encostas, os rios. Nesse período, muitas pessoas desistiram. Mas, não vou negar. Nós sofremos porque ainda não conhecíamos as ferramentas de trabalho”.
Depois da adaptação, os garis são encaminhados para as gerências da cidade. Sorriso foi para o bairro da Tijuca e, primeiro, teve que trabalhar no caminhão. “Os caras do caminhão devem ser aplaudidos de pé. Eu não aguentei. Na primeira viagem, já estava desmaiando, suado, cansado”, relembrou.
Ele pediu para ser transferido para varrer uma praça, onde trabalha há 23 anos. “Quando me inscrevi para Comlurb, eu sabia que queria aquilo. Sabia que ia ter que limpar ralo, capinar. Quando assinei o contrato para ser gari, sabia que teria que dar o meu melhor. Hoje, a empresa tomou outra proporção e expandiu suas áreas de atuação”, revelou Sorriso.
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Raiz no carnaval do Rio
Como a demanda durante o Carnaval é grande, muitos garis são designados a limpar a Marquês de Sapucaí entre as escolas de samba. Pouco tempo depois de entrar na Comlurb, Renato foi indicado para trabalhar na avenida.
“Da segunda para terceira escola, eu comecei a sambar. Não me aguentei. As arquibancadas já estavam começando a gritar ‘samba, samba’. Logo depois me chamaram para voltar nos outros dias para sambar”.
O sucesso foi mera consequência. Ele foi manchete no jornal no dia seguinte. Hebe Camargo o convidou para subir ao camarote e para ir ao seu programa de TV, em São Paulo. Depois, recebeu convite para desfilar no Fashion Week da capital paulista.
Mas, ele era apenas o Renato Luiz que sambava no carnaval do Rio. Até que em uma palestra disseram: “Para de sorrir, Sorriso”, em referência ao seu semblante e bom humor também presentes em toda entrevista à FOLHA DIRIGIDA.
Foi então que seu nome virou Renato Sorriso. “Imagina você pegar uma vassoura mal-humorado e varrer de qualquer jeito”, indagou.
Ele reconheceu seu papel social e sua importância para desmistificar a questão dos garis, por vezes invisíveis para sociedade.
“A imagem de lixeiro na rua começou a mudar. Era comum falar: ‘Se você não estudar, vai ser lixeiro’. Hoje, somos conhecidos como garis. Os valores mudaram. É preciso respeitar quem está em cima e apoiar quem está embaixo”.
Durante a entrevista, Renato Sorriso confirmou que a vassoura foi seu passaporte. Ele já viajou para mais de dez países sambando e participando de eventos. “Represento minha nação, minha pátria”, disse.
Ele, porém, não deixou de estudar. Terminou o ensino médio e concluiu a graduação em Turismo.
“Quando o homem pensar que a educação e os valores éticos são riquezas vamos viver melhor”.
Sorriso revelou que já recebeu inúmeras propostas para sair da Comlurb, mas não aceitou. “Sou melhor como gari e pior como artista. Eu vim à Terra para ser gari e para mostrar as pessoas que a nossa diferença é muito grande perante a nação”.
Para todos aqueles que sonham em passar no concurso para gari, ele deixou a seguinte mensagem: “Acredite no seu sonho. Assim como o gari Sorriso apareceu, outros podem também. Tragam coisas boas e que somem com a empresa. A Comlurb somos todos nós. Valorizem a vassoura”.